sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Frei Miguel escreve texto sobre a Pastoral de Veraneio. Vale ler, meditar e aplicar as sugestões do texto.

A voz da comunidade

É de compreensão geral que o período de férias facilita a participação das pessoas nas atividades religiosas, tendo assim oportunidade de renovarem sua espiritualidade. Também é sabido que no litoral estão os locais preferidos das pessoas para curtirem suas férias e participarem das atividades religiosas. Em face disto, as férias são um tempo propício para o crescimento espiritual e a evangelização. Por conseguinte, para o bom atendimento do Povo de Deus, tal período exige da Pastoral de Veraneio um profundo empenho apostólico das comunidades eclesiais, lideranças e sacerdotes. A ênfase do empenho pastoral é pela acolhida e motivação espiritual capaz de revigorar as energias das pessoas, numa atuação que alicerça um encantamento eclesial pela temporada de veraneio e pelos que buscam os serviços religiosos.

Tendo em vista o bom atendimento ao Povo de Deus em férias, a Pastoral de Veraneio propõe-se a missão de interagir entre descanso e fé, liberdade e participação, atendimento efetivo e afetivo, atenção comunitária e personalizada, ações organizadas e espontâneas. Como resposta predominante, a Pastoral de Veraneio baseia-se na profunda experiência de Deus sustentada na escuta e anúncio da Palavra de Deus, no celebrar a liturgia eucarística, no encontro com Jesus Cristo, na acolhida ao outro.

Ao considerar esses elementos indispensáveis à evangelização na temporada de férias, a Pastoral de Veraneio implica no cumprimento de um ardor por Jesus Cristo e em um atento apostolado aos habitantes de realidades paroquiais diferenciadas. A atuação da Pastoral de Veraneio realiza-se em torno de um apostolado essencial:

a)  Comunidades - a voz da acolhida

Em sociedade secularizada em que imperam o individualismo, isolamento, fechamento e anonimato capazes de levar ao esgotamento das energias, as férias são uma oportunidade de emancipação do indivíduo e de sua liberdade. Contrapondo-se a isto, pela Pastoral de Veraneio a Igreja apresenta-se como comunidade acolhedora e de superação dessa realidade. A Pastoral de Veraneio procura aproximar as pessoas para que não caiam no vazio da subjetividade. Também busca despertar o interesse pela revalorização da comunidade fundada na experiência amorosa a Deus e ao próximo. Em resposta à sociedade consumista e competitiva, a atuação da Pastoral de Veraneio busca valorizar o ser humano para a comunhão de comunidade eclesial, que oferece condições de revigorar a fé, e motivações para conduzir a vida segundo os valores cristãos.

Em resposta ao descanso e gozo das férias, a Pastoral de Veraneio, ao apresentar-se como Igreja acolhedora, dá destaque à razão de ser da comunidade de fé, que é oferecer em Jesus Cristo uma contraposição àquilo que pode se revelar ilusório. Tende a Pastoral de Veraneio a chamar as pessoas a estarem em comunhão, que é condição humana seguindo a experiência divina manifestada na unidade em Deus Pai, Filho e Espírito Santo. A motivação principal da Pastoral de Veraneio é favorecer ao ser humano desfrutar da experiência da comunhão com o Povo de Deus.

No prosseguir da resposta, o Concílio Vaticano II ressalta que a Igreja nasce do coração da Trindade e que é a fonte da comunidade cristã: “É o povo reunido na unidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo” (LG, n.4). Pois é nesta comunhão em Deus Trindade que a comunidade cristã recebe batismo e o ministério de professar a fé em comunidade. Nessa perspectiva, o itinerário da missão da Pastoral de Veraneio é inicialmente oferecer aos cristãos esse chamado a viver em comunhão com a comunidade do Senhor. A ênfase da Pastoral de Veraneio é expressar-se como comunidade acolhedora no princípio fundamental de fé na adesão a Deus. A sua atuação é ser fiel à vocação da Igreja: comunicar o rosto da Trindade, que se torna a melhor comunidade para se viver a fé e a vida. Assim, pelo retorno ao espaço sagrado, abraça-se o testemunho da Palavra de Deus.

b)  Comunidades - a voz da Palavra de Deus

A Pastoral de Veraneio, ao apresentar a Igreja fiel à vocação de ser luz e sal do mundo, volta atenção à segunda resposta ao descanso e renovação espiritual das pessoas. Nesta resposta está a significação do que é vital para a existência e missão da Igreja: a escuta e o anúncio da Palavra de Deus. A Palavra divina está na raiz e na gênese da história da salvação humana. O homem e a mulher foram criados à “imagem e semelhança de Deus” (Gn 1,27). O salmista canta o poder criador da Palavra: “Pela Palavra do Senhor foram criados os céus... porque ele falou e tudo foi feito, ele mandou e tudo existe” (Sl 33,6.9). Moisés é convocado pela voz da Palavra: “Deus falou-vos do meio do fogo: ouvíeis uma voz de palavras, mas não víeis nenhuma figura; só uma voz” (Dt 4,12). A escuta da Palavra está na origem do ser, da criação, da redenção humana e de orientação da história.

Em temporada de verão, a missão da Pastoral de Veraneio concentra-se em levar as pessoas para o acolhimento da mensagem da Palavra do Senhor. Em decorrência desta missão, a Pastoral de Veraneio constitui-se em abrir canais de anúncio da Boa-Nova em novos espaços, com novos métodos e com novas relações em contextos de temporada de férias. Na missão de propagar a Boa-Nova da Salvação, a mensagem da Pastoral de Veraneio alimenta a fé das pessoas e das comunidades cristãs identificadas em Cristo e é testemunha da presença de Deus na história.

A temporada de veraneio, como novo mundo fecundo da missão, desenvolve a comunidade cristã que vive à luz da Palavra de Deus. Então, a Igreja que nasce do coração da Trindade prega que é pela Palavra que Deus faz o mundo obra sua, conduz seu povo e ilumina a história da humanidade. As comunidades protagonistas da Pastoral de Veraneio reconhecem que Deus revela pela Palavra seu poder: “Ela é como a chuva que desce do céu e para lá não volta sem ter regado a terra, tornando-a fecunda e fazendo-a germinar, dando semente ao semeador e pão ao que come. Ela não torna a ele sem ter produzido fruto e sem ter cumprido a sua vontade” (Is 55,10). O conteúdo da missão da Pastoral de Veraneio é proclamar a Boa-Nova, mostrando o sentido de ser Igreja e fazendo seguidores de Jesus, a exemplo dos Doze e das primeiras comunidades cristãs. Uma fé alimentada pela Palavra de Jesus Cristo leva ao testemunho de comunidade.

c)  Comunidades - a voz litúrgico-eucarística

A razão de ser da comunidade cristã que nasce do coração da Trindade é desfrutar dos bens salvíficos oferecidos pela comunhão em Deus, especialmente na Eucaristia. Nesse entendimento, o Concílio Vaticano II ressalta ser a comunhão Eucarística a “fonte e ápice de toda a vida cristã” (LG, n. 11). Isto significa que há outro elemento e caminho de atuação teológico-pastoral importante para alimentar a comunhão eclesial e a fé da comunidade cristã.

Em temporada de veraneio, é importante que a Igreja se apresente como uma comunidade de voz litúrgica e eucarística e valorize essa experiência de fé. Os veranistas, motivados pela voz da comunidade acolhedora e da comunidade da Palavra, percorrem o caminho para a perfeita unidade com Deus no encontro com Jesus Eucarístico. Nesse encontro pessoal e comunitário com a Palavra e com a Eucaristia, a Igreja conduz a todos para continuarem o gesto concreto do lava-pés de Jesus (Jo 13,1ss). Então a narração evangélica da última ceia, memorial do sacrifício de Cristo, quando proclamada na celebração eucarística, converte-se na missão da Igreja que quer alimentar a todos com o pão da vida, o Corpo de Cristo.

Em resposta ao descanso e gozo das férias, a Pastoral de Veraneio desperta para o encontro com Jesus. Por conseguinte, para revigorar as pessoas de fé é imprescindível estar munido da voz da comunidade acolhedora, da Palavra, do Mistério Eucarístico. Sem a necessidade de megaeventos ou megashows, a cena de Emaús (Lc 24,13-35) pode orientar a atuação da Pastoral de Veraneio onde acontecem os passos necessários de acolhida da Palavra que segue, à mesa, a fração do pão eucarístico. É por isso que a Pastoral de Veraneio pode aproveitar a temporada de veraneio para revigorar as pessoas na fé e reinseri-las na comunidade de Cristo. Com isso se apresenta o que sustenta a Igreja e põe no centro o que deve ser da vida cristã “a liturgia da palavra e a liturgia eucarística, unidas tão intimamente entre si, que constituem um só ato de culto” (SC 56). 

d)  Comunidades - a voz do caminho

A quarta resposta ao bom proveito das férias para revigorar as energias e a espiritualidade das pessoas, capaz de conservar uma genuína substância dos conteúdos de fé contrapondo os riscos à cultura cristã, aspira ultrapassar as fronteiras dos espaços sagrados. A cultura secular entende que há novos caminhos do mundo além dos religiosos, há uma fecundidade cultural e humana diferenciada do perfil das linguagens, concepções, tradições e símbolos religiosos. Um mundo plural tende a ultrapassar as fronteiras religiosas cristãs. Todavia, a Palavra de Deus revela um espírito excepcional de inculturação. Isto significa que a Palavra de Deus pode chegar a todas e às novas culturas humanas. Ela é fundamental para qualquer cultura, geração e tempo.

É próprio da mensagem da Palavra avançar em novos caminhos. “De Sião sairá a Lei e de Jerusalém a Palavra do Senhor” (Is 2,3). De fato, a Voz de Deus sai de sua casa, do templo, da Igreja, entra pelas estradas do mundo e sua peregrinação continua em busca de acolhida de sua mensagem. Em cultura secular, as informações são rapidamente socializadas por sofisticadas técnicas e redes de comunicação, por isso a mensagem de Deus precisa adaptar-se a outros métodos de comunicação. Propor-se como se lê a mensagem do Cristo ressuscitado que envia os apóstolos: “ide e fazei discípulos todos os povos (...), ensinando-os a observar tudo o que eu vos mandei” (Mt 28,19-20). A mensagem da Palavra não fica inadequada aos novos caminhos, como a praia e o litoral.

A comunidade como voz do caminho responde a toda a cultura e a todo tempo: “Eis que estou à porta e bato. Se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, irei ter com ele, cearei com ele e ele comigo” (Ap 3,20). Diante dos dramas e paradoxos da cultura secular, a comunidade como voz do caminho pode mergulhar no novo mundo com múltiplas formas de comunicação, fazendo ressoar sua mensagem em novos horizontes como o litoral. A Pastoral de Veraneio é chamada a fecundar a cultura das férias e assim conservar a missão da Igreja de ultrapassar as tradicionais fronteiras, chegando aos novos sinais dos tempos.
            
    e) Comunidades - a voz da espiritualidade

Os caminhos para responder ao descanso e gozo das férias são múltiplos, porém, outro ponto fundamental para a atuação da Igreja é a espiritualidade. A eficaz acolhida da Palavra de Deus vem precedida por uma profunda experiência de oração. Constitui-se a oração em um meio de conservar e difundir o anúncio da mensagem de Deus para seu povo. Com muitas formas de rezar, por vezes silenciosas, sem palavras, as pessoas respondem a uma vontade de intimidade com Deus capaz de renovar suas energias.

A comunidade como voz da espiritualidade constitui-se num grande testemunho da Igreja de acolhida, da Palavra, da Eucaristia, do caminho em Cristo. A atuação da Pastoral de Veraneio está entrelaçada com o que São Paulo recorda: “A palavra de Cristo habite entre vós com toda sua riqueza: com toda a destreza ensinai-vos mutuamente. De coração agradecido cantai a Deus salmos, hinos, cânticos inspirados” (Cl 3,16). Isto significa que a espiritualidade é um luzeiro para a Pastoral de Veraneio e um dos grandes pilares para as pessoas em férias.


Concluem-se as respostas no reconhecimento que a temporada de verão implica na Pastoral de Veraneio atuar nas mais diversas formas para fortalecer as energias e a espiritualidade das pessoas, grupos, comunidades. É consenso que as pessoas livres de compromissos profissionais, na temporada de veraneio e na praia, encontram seu lugar privilegiado para revigorar a fé no encontro com Cristo e com a comunidade, eco de sua voz. Munir-se de preparados ministérios de acolhida, da palavra, da liturgia e outros será imprescindível para que a voz da compreensão, da interpretação, do testemunho e da comunicação da Palavra abra múltiplos caminhos de encontro com o Senhor.
                                                  Texto: Frei Miguel Debiasi
                                                   Mestre em filosofia e teologia

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